segunda-feira, 29 de julho de 2013

A história da Libertadores e Minas Gerais

Sou da opinião de que títulos são importantes, mas não são tudo no futebol. Não consigo entender a chatice desse pessoal que não liga para a história e paixão envolvida em cada um dos sucessos e fracassos dos clubes. Para esses, o futebol se reduz a uma certeza matemática.

Mas o que é ainda mais esquecido é a história das próprias competições. É muito comum que campeonatos importantes desapareçam, o que faz com que grandes glórias sejam esquecidas. O curioso é que, no caso da Libertadores, o contrário aconteceu. Um torneio no começo acanhado, aos poucos ganhou um status antes inimaginável. Os títulos da Libertadores dos clubes de Minas Gerais ilustram bem essa história, de um campeonato que começou como um torneio qualquer, passou por períodos conturbados, até a consagração como maior título do continente.

1. Copa Libertadores de 1976

O principal a se dizer é que, nos anos 70, ninguém dava bola para a Libertadores. Era normal ver times reservas indo disputar a competição. 

Não acredita? Pois bem, basta ver o que dizia a Placar na época.

Um torcedor do Cruzeiro diz sobre a final de 1977: "Olha, a torcida do Cruzeiro prefere mil vezes ganhar o Campeonato Mineiro em cima do Atlético a ser bicampeão da Libertadores. [...] Mas todo mundo está pensando numa coisa: se o Cruzeiro for bicampeão da Taça, vai entrar com força total sobre o Atlético na decisão do campeonato."

Ou seja: a Libertadores servia de mero aquecimento para a final do Campeonato Mineiro, já que, segundo o torcedor, "o que sustenta esta torcida é o Galo, vitórias sobre o Galo".

Já outro torcedor é um pouco mais otimista quanto à Libertadores. Como a torcida do Boca foi deselegante em Buenos Aires, diz que "ganhar a Libertadores passou a ser algo tão sério como derrotar o Galo".

Naquela época, torneios internacionais não tinham importância alguma. Até o campeonato regional era mais valorizado.  Assim, o título de 1976 mal foi comemorado na época e não teve muita repercussão. Era um título menor. Ao longo dos anos, com a Libertadores sendo valorizada, é que se criou o mito de que foi uma grande conquista.



2. Copa Libertadores de 1997

Nos anos 90, a Libertadores já era muito mais valorizada, mas ainda passava por altos e baixos. Em 1997 um fato inusitado aconteceu e colocou em xeque a credibilidade do torneio. Uma crise generalizada tirou do jogo o país com os clubes mais vitoriosos até então: a Argentina. O ano de 1997 ficou marcado como o início do lento declínio dos clubes "hermanos". Uma crise generalizada fez com que os clubes enviassem os times de base ou jogadores reservas. A situação foi tão grave que os jogadores, irritados com os clubes, deflagraram uma greve geral (saiba mais em reportagem do La Nacion). Aquele campeonato ficou conhecido como a "Libertadores café com leite".

Não por acaso, a imprensa internacional na época lamentou o fato de que a final seria disputada por um clube que jamais havia sido campeão nacional contra o representante do inexpressivo futebol do Peru, o Sporting Cristal - que até hoje não ganhou mais do que o Campeonato Peruano e tem um estádio para apenas 15 mil torcedores.

A própria diretoria do Cruzeiro reconhecia que o time não era dos melhores. Com medo de um vexame histórico na disputa intercontinental contra o Borussia Dortmund, começou a contratar por 6 meses jogadores da Seleção Brasileira especialmente para o confronto. Entre eles o jogador Bebeto.

3. Copa Libertadores de 2013

Ao longo dos anos, a Copa Libertadores foi ganhando cada vez mais importância. O número de clubes que participam aumentou gradativamente, o que valorizou a competição e a deixou mais disputada. Elemento essencial é a participação de clubes mexicanos, que em um primeiro momento desprezavam a competição. Hoje, a taça é muito cobiçada no país. Os clubes mexicanos se tornaram uma nova potência, inclusive rivalizando com os argentinos.  O que fez a competição mudar de patamar de vez foi a passagem da disputa intercontinental para o Mundial de Clubes da FIFA.

O caminho do Atlético na competição ilustra bem as dificuldades dessa nova Libertadores. O clube foi o primeiro lugar geral em um grupo "da morte". Depois, atropelou o tradicional São Paulo e deixou para trás o Campeão Mexicano e o Campeão Argentino, para derrotar na final o tri-campeão Olímpia. Não foi nada fácil.

Alguns elementos mostram a importância da Libertadores hoje:

* A final obteve a maior renda da história do futebol do continente, chegando a assustadores 14 milhões de reais

* O Mundial da FIFA será disputado no Marrocos. Cada vez mais países disputam o torneio, que atrai turistas e visibilidade

* A final foi transmitida em cadeia nacional pela Rede Globo de Televisão, assim como a semifinal (em 2009, o mesmo não aconteceu com o Cruzeiro sequer na final). Foi transmitida, também, para o mundo todo pela Fox Sports

* O resultado final foi destaque nos maiores jornais do mundo, que exaltaram Ronaldinho Gaúcho

O que podemos concluir? Corinthians e Atlético ganharam a Libertadores na hora certa. Daqui pra frente, a tendência é que continue difícil e o título mais cobiçado do continente.

sábado, 18 de julho de 2009

O que significa a derrota do Cruzeiro?

E o Cruzeiro perdeu a Libertadores dentro de casa. Alguém mais experiente, pouco impressionado com o oba-oba promovido pela mídia, poderia pressentir o que era uma tragédia anunciada. O clube de Belo Horizonte entrou em campo já campeão, só se esqueceu de avisar o time do Estudiantes. Três dias antes, contra o maior rival Atlético, a torcida celeste gritou "Olé" enquanto seu time perdia. Não ousou fazer o mesmo na noite de quarta-feira. Enfim, foi um verdadeiro Mineirazo.


Em primeiro lugar, é preciso apontar que a festa antecipada da torcida era inevitável. A grande mídia, como de costume, foi irresponsável e fez coro. Poucos foram os que apontaram o óbvio - um empate fora de casa contra um finalista da Libertadores não garante nada. O mercado midiático faz com que os jornalistas esportivos digam o que os torcedores querem ouvir em vez de oferecerem uma análise qualificada e séria. Nada mais previsível, quem faz o contrário é crucificado pela torcida. Não consigo entender gente que prefere ler que o time será campeão quando ocupa a parte de baixo da tabela em vez de uma análise séria. Se é pra iludir, devíamos deixar as colunas nas mãos de representantes dos clubes.


Pelos mesmo motivos, ninguém agora ousa apontar culpados. E o culpado foi Adílson Batista. Apesar do bom trabalho, ele sempre pecou pela inexperiência. E dessa vez ficou claro que esse foi o motivo da derrota. Era papel dele conter os ânimos da equipe e não deixar o clima de "é campeão" contagiar os jogadores. Falhou.


Dito isso, e agora que a tristeza cruizerense - abafada pela festa atleticana, que respondeu de forma brilhante às provocações de domingo - arrefeceu, é possível avaliar o significado desse jogo com mais responsabilidade.


Digo desde já que não acho que ele tenha tido grande importância. O Cruzeiro continua sendo o único clube de Minas Gerais com dois títulos da Libertadores da América e, ainda assim, o segundo clube do estado.


É possível analisar um clube pelo número de títulos? Apenas para aqueles pobres de espírito que nunca entenderão do que se trata o futebol. Jaeci Carvalho, carioca que trabalha na imprensa mineira, fez uma dessas comparações estapafúrdias. Colocou Atlético ao lado de Cruzeiro e disse que "só estão empatados no número de (campeonatos) brasileiros". Se fosse assim tão fácil, poderíamos demitir todos os jornalistas que trabalham cobrindo o esporte. Um estatístico bastaria. Também poderíamos deixar de passar horas e horas nos botecos, nas praças, no trabalho discutindo e revivendo grandes momentos que fizeram parte de nossa história. E futebol é isso - história.


Não é muito difícil comprovar esta tese. Muitos dos campeonatos hoje considerados importantes, como a Libertadores, já foram desprezados. Nas primeiras décadas da disputa da Copa Libertadores, por exemplo, era comum que clubes brasileiros privilegiassem clássicos regionais e enviassem a equipe reserva para o campeonato continental. Isso ainda acontece em alguns países. Os míopes jaecis esquecem também que os campeonatos mais respeitados só começaram a ser disputados há poucas décadas. O futebol brasileiro - e o mineiro, por causa de Atlético e Vila Nova - são centenários. Joga-se 60 anos de história no lixo?


A Copa do Brasil, por exemplo, tinha tudo pra ser uma copa respeitada. Quando os times que participam da Copa Libertadores deixaram de disputá-la, se tornou um torneio desprezado. Eu já ouvi da boca de dirigente que existe a idéia de se extinguir a Libertadores (ou transformá-la em algo parecido com a atual Sulamericana) e se fazer um torneio mundial de clubes mais extenso. E que isso só não acontece pois a Champions League é muito lucrativa.


Se um novo patrocinador exigir uma mudança no formato e no nome da atual Libertadores, toda a sua história deixará de ser relevante? Não, óbvio que não. Mas não pensam nisso os que acham que o futebol se resume a uma tabela com números.


A mágica, a graça do futebol está justamente em que ele é um fenômeno maior que o esporte e as confederações. Ele mobiliza a paixão de milhões e, assim, a grandeza de um clube só pode ser medida em função disso. Não quero dizer que títulos não são importantes, óbvio que são. Fazem parte da história do futebol, são fundamentais. Mas um título não é igual a outro.


Alguém acredita que o título do campeonato paulista conquistado pelo Corinthians em 1977 vale tanto quanto o desse ano? Ou que a conquista da Copa do Mundo de 1970 vale tanto quanto a de 2002? Ou que a derrota do Fluminense na final da Libertadores vale tanto quanto a do São Caetano?


Não valem, pois o futebol é história e não números. E é essa história, formada por vitórias e derrotas, títulos e vice-campeonatos, que gera ídolos, torcidas, rivais. E é nisso que reside a grandeza de um clube. Torcer não é fazer uma aposta racional no clube que tem a maior probabilidade de conquistar o mais novo título da moda.


Um possível título da Libertadores do Atlético valeria mais do que o do Cruzeiro. E isso se deve ao fato de que Galo é o clube mais tradicional de Minas Gerais e tem a torcida mais apaixonada, e isso só a história explica. A torcida do Galo, talvez por ter sido tão roubada, tão frustrada, não se abate e apóia sempre. A do Cruzeiro é a exigente. Em uma final de Libertadores, se omitiu e deixou de apoiar o time assim que levou o gol de empate. Parte das torcidas organizadas deixou o Mineirão após a virada.


Aqueles que se impressionaram com as manifestações atleticanas pela derrota do rival não sabem de nada. Se o Galo estivesse em uma final da Libertadores, Minas Gerais estaria parada.